Na região semiárida do Brasil, que compreende os nove Estados do Nordeste e o norte de Minas Gerais, estão localizados 90% dos municípios com maior número de residências permanentemente fechadas, de acordo com os dados do Censo Demográfico de 2022. Além disso, o levantamento também indica que o crescimento populacional do semiárido de 3,7% ficou abaixo da média nacional de 6,5%.
Jurandyr Ross, geógrafo e professor do Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, explica que o fenômeno no semiárido não tem relação direta com as mudanças climáticas. “A ocupação do seminário vem sofrendo, ao longo do tempo, um certo esvaziamento demográfico, que é crônico e que está relacionado com questões sociais”, esclarece o geógrafo.
Principais causas
O processo demográfico diagnosticado com os dados do Censo 2022 é apontado por Ross como continuidade de uma tendência causada pelas condições climáticas do semiárido e dificuldades socioeconômicas. Dessa forma, o geógrafo comenta que a busca por estudo e trabalho incentiva o deslocamento populacional interno para regiões com maiores oportunidades e, consequentemente, os números de residências permanentemente fechadas na região.
“O clima em si dificulta as atividades agrícolas, mas também há outras questões, como os pontos de atração para os jovens em cidades litorâneas em função do emprego relacionado ao desenvolvimento do turismo”, discorre Ross. Além disso, o geógrafo menciona que as migrações também se destinam para o Centro-Oeste, Amazônia e Pará em busca de trabalho.
Histórico
A região semiárida, mais especificamente a nordestina, é extremamente marcada por movimentos migratórios, tanto permanentes quanto temporários. Ross nota, todavia, que nos últimos anos a população rural, sobretudo os idosos e crianças sem pais, ou seja, aqueles que não possuem condições de irem para os polos de atração, tem deixado suas residências para viver em pequenas vila ou cidades.
“Aqueles fluxos tradicionais do Nordeste para o Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte, ou seja, para cidades grandes do Sudeste, é um fluxo que acredito que não seja o mais importante hoje”, afirma Ross ao justificar que não existem tantas oportunidades de trabalho. Nesse cenário, a população se dedica à economia informal em suas próprias localidades. Como exemplo, o geógrafo menciona as comunidades que se estabelecem ao longo de estradas e se desenvolvem a partir de atividades comerciais das mais diversas com caminhoneiros que atravessam a área.
As políticas assistencialistas também acompanham o histórico da região semiárida, como o Bolsa Família, Bolsa Gás, entre outros. O geógrafo explica que tais políticas, apesar de contribuírem para a melhora da condição de vida das pessoas, apresentam um impacto limitado e precisam estar acompanhadas de mudanças nas políticas públicas voltadas para a saúde, educação e moradia.
Perspectivas
Apesar de o fenômeno demográfico atual não ter relação direta com a emergência climática, os efeitos deste a longo prazo podem potencializar o esvaziamento da região semiárida. De acordo com Paulo Artaxo, professor titular do Departamento de Física Aplicada da USP, a mudança climática já está intensificando o aumento das temperaturas e a redução da precipitação.
Além disso, o professor indica que a região do semiárido brasileiro é particularmente sensível devido à sua localização tropical e a muitas áreas urbanas, como Teresina. Com as mudanças climáticas, Artaxo aponta que a previsão de alterações de temperatura variam de 4ºC a 4,5ºC. “Assim, onde o verão já acontece a temperaturas da ordem de 42 graus, quando essas temperaturas atingirem, por exemplo, 48 ou 49 graus, o impacto será muito difícil nas atividades econômicas e na saúde da população da região”, alerta o professor.
Por Raquel Tiemi/Jornal da USP